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terça-feira, 11 de agosto de 2009

Reforma Ortográfica: Educador aponta incoerências do acordo


O professor Ernani Filgueiras Pimentel é pesquisador e leciona Língua Portuguesa há mais de 40 anos, e explica que toda a vez que entra em sala para falar de ortografia, quando trata-se de capítulo que não tem a menor lógica, fica frustrado pois acaba sendo um capítulo de decoreba.
Sobre o Acordo Ortográfico, o professor diz que imaginava que a Academia Brasileira Letras e a Academia de Ciências de Lisboa fossem trabalhar com profundidade e seriedade a mudança nas regras. "Me assustei com o grau de superficialidade com que trabalharam esse acordo", observa.
O professor é contundente em suas críticas: "Este é um acordo que foi trabalhado de 1980 a 1990, de costas para o mundo. Eu mesmo escrevi artigos e nunca obtive nenhuma resposta, até depois que se criou a Comissão de Língua Portuguesa do Ministério, sendo que escrevi vários artigos para lá e nunca obtive nenhuma resposta. Eu não sei se eles têm procuração da população brasileira para poder decidir isso. Minha procuração eles não tiveram. Depois que termina um acordo desse, de 10 anos, com mais 19 anos para implantação, se implanta uma coisa chamada Acordo que não tem profundidade".
Confira, a seguir, algumas observações do educador sobre o acordo:
Caso do x - Por exemplo, que justificativa eu posso dar para um aluno, ao dizer que extensão se escreve com x e estender se escreve com s, e existem dezenas de palavras derivadas do termo estender. Dezenas escritas com s, dezenas escritas com x, quando todos nós sabemos que tudo veio do latim extendere, que é só com x. Logo, eu sei escrever latim e não sei escrever português. Porque em latim se um radical é com x ele permanece em toda a família. Em Português entrou erradamente. E ninguém mexeu.
Caso do hífen - Existem centenas de casos como esse. O que a gente pode falar para os alunos. "Você tem que decorar, tem que olhar para um dicionário". Eles criaram as regras do hífen, simplificaram, mas existem três critérios diferentes para a regras do hífen. Eles podiam ter adotado um único critério.
Exceções - Existem absurdos como exceções. Como é que você escreve guarda-chuva com hífen e mandachuva sem hífen. Que justificativa eu vou dar para dizer que Nova Guiné é sem hífen e Guiné-Bissau é com hífen. Não tem lógica. Todos os nomes de lugares compostos não usam hífen. Agora Guiné-Bissau e Timor-Leste são as exceções. Aliás, no acordo não tinha Timor leste, era só Guiné Bissau. Agora que a ABL colocou o Timor Leste. Outra, o acordo coloca regras e exceções, porque não eliminarão as exceções, se é maneira de simplificar o ensino. Por incrível que pareça, o argumento é "porque estão consagradas pelo uso". Ora, então não podia fazer acordo, porque tudo está consagrado pelo uso. É incoerente, quem apresenta por escrito uma justificativa dessa esta colocando por escrito um atestado de inconsistência lógica, não sabe pensar. E aí nós somos obrigados a conviver com um monte de absurdos. Não faz sentido ter exceção. O acordo ortográfico é para se discutir grafia, não se pode mexer na língua. Não se mexe na pronúncia. Tirar o trema vai mexer na grafia mas também na pronúncia. Então não se podia mexer no trema, porque ele também interfere na pronúncia.
Portugual e o Acordo - Primeiro Portugal não implantou o acordo. No Brasil, a própria ABL tem que ficar se esforçando para eliminar omissões, esquecimentos. Por exemplo, colocaram o Timor Leste, se está desrespeitando o acordo. Esse acordo foi feito de costas para a sociedade, não houve debate aberto.
Objetivos da crítica - O que nós queremos é avançar com esse acordo, não queremos acabar com ele. Porque já foi um grande passo você ter conseguido oito países para assinar o acordo. Nós queremos evoluir, eu e um monte de professores que sabem o que estão falando. Nós queremos que se discuta abertamente uma maneira de simplificar esse acordo. Em 1980, falando com o professor Antonio Houaiss sobre a necessidade de se fazer um levantamento dos radicais da língua e criar uma possível padronização desses radicais, na maneira de escrever, naquela época ele me disse: "professor, mas são 250 mil palavras". Hoje conversando na ABL, 39 anos depois, me dizem "professor são 380 mil verbetes". Trinta anos depois eu não posso aceitar o mesmo argumento. Na realidade podem ser 380 mil verbetes. Mas quantos radicais são? 50, 60 mil? Pelo que eu saiba os cursos de Letras federais têm 180 mil estudantes. Se as universidades federais e o MEC incentivassem uma pesquisa sobre os radicais da língua, seria um radical para cada três estudantes. Nesse argumento a academia está trinta anos atrasada.
Dicionário - Querem que a população brasileira continue escrava de dicionários. Ninguém sabe escrever Língua Portuguesa, nem em Portugal e em nenhum país, porque não existe lógica na nossa ortografia. O brasileiro sai da universidade e passa o resto da vida consultando o dicionário para saber como se escreve essa ou aquela palavra. Isso é falta de lógica e muito dinheiro que um país perde com o tempo dos seus cidadãos. Imagina que todo esse tempo que ele perde consultando dicionário fosse empregado em lazer e produtividade. É incoerente gastar dinheiro e tempo com uma bobagem como a escrita. A escrita não tem nada a ver com a língua, é só um código.
Ensino - Nós temos que pensar em coisas sérias. Ao invés de os alunos saírem do ensino médio com 200 horas/aula de ortografia e não sabendo escrever, eles têm que sair com 20 horas e sabendo escrever. É isso que queremos e isso é possível. Basta que as autoridades tomem consciência disso. É o que nós precisamos debater com jornalistas, linguístas, gramáticos, professores, que não podem ficar de lado. Para ver de que maneira nós podemos simplificar nossa ortografia e fazer com que a nossa língua seja muito mais fácil de se escrever, para poder economizar e ao mesmo tempo ensinar com mais facilidade para os outros países.
Dependência de outros países - Esse é um trabalho que o Brasil pode fazer sozinho. Mas é lógico que devemos chamar outros países, porque todos vão ser beneficiados. E eles vão querer porque nós vamos chegar com um modelo de educação muito mais simples. Vai ficar muito mais barato para os outros países adotarem, poderão ensinar com facilidade e mais rapidez. Porque as pessoas colocam dificuldade? Porque são comodistas. Antes de conversar com os outros países vamos discutir aqui dentro e sentir que tem um caminho muito fácil para ir. Eu tenho certeza que ninguém vai ser contra o barateamento e a independência do brasileiro, do português, do angolano, do moçambiquense, desse negócio chamado dicionário. Isso é prova da nossa ineficiência.
Movimento - Estou no Senado promovendo o movimento "Acordar melhor". Iremos conseguir que a Comissão de Educação do Senado convoque uma sessão para discutir isso. A idéia é que professores de Português, estudantes, abracem esse movimento, assinem o manifesto e divulguem. Porque é um absurdo estudar um negócio para nunca saber. Temos que simplificar para ficar fácil para todo mundo, sem mexer com a língua.
Serviço
www.acordarmelhor.com.br
27/05/2009

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