Falar sobre o novo acordo ortográfico implica saber que em termos históricos já se fizeram várias tentativas de unificação da ortografia da língua portuguesa, sendo que a primeira data de 1911, que culminou em Portugal na primeira grande reforma. Depois existiram várias tentativas, sendo a mais importante a de 1990 que é a que está por trás de todo o celeuma levantado actualmente sobre esta questão.
Quando vai entrar em vigor este acordo?
Seguindo o disposto numa reunião da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), realizada em Julho de 2004 em São Tomé e Príncipe, ficou decidido que para o novo acordo entrar em vigor, bastaria que três países o ratificassem. O Brasil em Outubro de 2004, Cabo Verde em Abril de 2005 e São Tomé em Novembro de 2006 ratificaram o acordo, estando assim cumprido o disposto nessa reunião da CPLP. Em Portugal, este acordo foi ratificado pelo Governo a 6 de Março de 2008, faltando a aprovação no Parlamento ou pelo Presidente da República. Caso seja aprovado, entrará imediatamente em vigor, no entanto está permitida uma fase de adaptação de 6 anos onde são permitidas as duas grafias.
O que muda, afinal?
O alfabeto português passará de 23 para 26 letras, com a inclusão em definitivo do k (capa ou cá), do w (dáblio, dâblio ou duplo vê), y (ípsilon ou i grego).
O uso de maiúsculas e minúsculas obedece a novas regras:
- os meses do ano e os pontos cardeais deverão ser escritos em minúsculas (janeiro, fevereiro e norte, sul, etc.).
- poder-se-á usar maiúsculas ou minúsculas em títulos de livros, no entanto a primeira palavra será sempre maiúscula (Insustentável Leveza do Ser ou Insustentável leveza do ser)
- também é permitida dupla grafia em expressões de tratamento (Exmo. Sr. ou exmo. sr.) em sítios públicos e edifícios (Praça da República ou praça da república) e em nomes de disciplinas ou campos do saber (História ou história, Português ou português)
A supressão de consoantes mudas tal como o nome indica, vai levar ao desaparecimento de consoantes, em que o critério para tal é a sua pronúncia.
- cc - ex.: transacionado, lecionar. Mantém-se em friccionar, perfeccionismo, por se articular a consoante.
- cç - ação, ereção, reação. Mantém-se em fricção, sucção.
- ct - ato, atual, teto, projeto. Mantém-se em facto, bactéria, octogonal.
- pc - percecionar, anticoncecional. Mantém-se em núpcias, opcional.
- pç - adoção, conceção. Mantém-se em corrupção, opção.
- pt - Egito, batismo. Mantém-se em inapto, eucalipto.
Passam a ser suprimidos alguns acentos gráfico em palavras graves: crêem, vêem, lêem passam a creem, veem e leem; pára, pêra, pêlo, pólo passam a para, pera, pelo e polo. As palavras acentuadas no ditongo oi e ei passam a ser escritas sem acento: estoico, paleozoico, asteroide e boleia, plateia, ideia. Existe também a supressão completa do trema(¨): aguentar (e não agüentar), frequente (e não freqüente), linguiça (e não lingüiça). Supressão do acento circunflexo em abençoo, voo, enjoo.
O uso do hífen vai ser suprimido em:
- palavras compostas em que o prefixo termina em vogal e o sufixo começa em r ou s, dobrando essa consoante: cosseno, ultrassons, ultrarrápido.
- o prefixo termina em vogal diferente da incial do sufixo: extraescolar, autoestrada, intraósseo.
- formas monossilábicas do presente do indicativo do verbo haver: hei de, hás de.
O hífen emprega-se em:
- palavras compostas onde a última vogal do prefixo coincide com a inicial do sufixo, excepto o prefixo co- que se algutina ao sufixo iniciado por o: contra-almirante, micro-organismo, coobrigação.
- palavras que designam espécies da Biologia ou Zoologia: águia-real, couve-flor, cobra-capelo.
Pode existir dupla grafia em algumas palavras?
Sim. Isso está previsto no novo acordo por existirem diferenças na pronúncia de país para país assim temos:
característica | caraterística |
intersecção | interseção |
infeccioso | infecioso |
facto | fato |
olfacto | olfato |
conceção | concepção |
súbdito | súdito |
amnistia | anistia |
amígdala | amídala |
súbtil | sútil |
académico | acadêmico |
ingénuo | ingênuo |
sénior | sênior |
cómico | cômico |
vómito | vômito |
fémur | fêmur |
abdómen | abdômen |
bónus | bônus |
bebé | bebê |
puré | purê |
judo | judô |
metro | metrô |
andámos | andamos |
Argumentos a favor
- aproximação da oralidade à escrita
- actualmente a Língua Portuguesa é a única que tem duas grafias oficiais
- simplicidade de ensino e aprendizagem
- unificação de todos os países de língua oficial portuguesa
- fortalecimento da cooperação educacional dos países da CPLP
- evolução da língua portuguesa
- pequena quantidade de vocábulos alterados (1,6% em Portugal e 0,45% no Brasil)
- o português é o 5º idioma mais falado no mundo e o 3º no mundo Ocidental. A unificação das grafias permite aumentar, ou pelo menos manter a força da Língua Portuguesa no panorama mundial
Argumentos contra
- evolução não natural da língua
- tentar resolver um “não-problema”, uma vez que as variantes escritas da língua são perfeitamente compreensíveis por todos os leitores de todos os países da CPLP
- desrespeito pela etimologia das palavras
- a não correspondência da escrita à oralidade. Por exemplo, existem consoantes cuja função é abrir vogais, mas que o novo acordo considera mudas nomeadamente em tecto, passando a escrever-se teto, dever-se-ia ler como teto (de seio)?
- processo dispendioso (revisão e nova publicação de todas as obras escritas, os materiais didáticos e dicionários tornar-se-ão obsoletos, reaprendizagem por parte de um grande número de pessoas, inclusivé crianças que estão agora a dar os primeiros passos na escrita)
- o facto de não haver acordo, facilita o dinamismo da língua, permitindo cada país divergir e evoluir naturalmente, pelas próprias pressões evolutivas dos diferentes contextos geo-sócio-culturais como no caso do Inglês ou do Castelhano
- afecto com a grafia actual
- falta de consulta de linguistas e estudo do impacto das alterações
Em termos legais e jurídicos também parece haver falta de consenso:
"Vasco Graça Moura, escritor e tradutor premiado e deputado no Parlamento Europeu (e ex-advogado), o mais conhecido dos detractores portugueses do Acordo, defende que o Segundo Protocolo Modificativo, como qualquer outra convenção internacional, só obriga à sua aplicação em cada país se for ratificado por todos os países signatários, o que ainda não aconteceu. Ou seja, só depois de todos os países ratificarem este Protocolo é que estes ficam obrigados a implementar o Acordo internamente caso este seja ratificado por três países. A racionalidade jurídica dum tratado que obriga um país a aprovar outro tratado caso este seja aprovado por países terceiros é disputada. No entanto, o argumento da ilegalidade da ratificação do Protocolo modificativo de 2004 é contestado pelo jurista Vital Moreira[8]."
in Acordo Ortográfico de 1990 - Wikipédia, a enciclopédia livre
Por tudo o que foi dito, parece-me que ainda vai correr muita tinta, e muita discussão sobre este acordo. Como diz o ceguinho: “A ver vamos!”
Fontes:
- “atual - O novo acordo ortográfico” de João Malaca Casteleiro e Pedro Dinis Correia
- Wikipedia
- Acordo Ortográfico: a perspectiva do desastre de Vasco Graça Moura
- Ciberdúvidas da Língua Portuguesa
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